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Josias de Souza

Vaccari despeja na CPI toda sua meia verdade

Josias de Souza

09/04/2015 16h43

Desobrigado pelo STF de assinar na CPI da Petrobras um termo de compromisso de dizer a verdade, o tesoureiro do PT João Vaccari Neto despejou diante das lentes da TV Câmara todas as meias verdades que dão a ele a aparência de uma condenação esperando para acontecer. O depoente portou-se como um robô. Programado com antecedência, não se desviou um milímetro do roteiro traçado por seu advogado.

Vaccari admitiu tudo o que as provas recolhidas na Operação Lava Jato já tornaram irrefutável. E tergiversou sobre detalhes ainda sujeitos ao contraditório. Sim, conhecia os delatores Alberto Youssef, Pedro Barusco e Paulo Roberto Costa. Mas as acusações que fizeram contra ele não são verdadeiras.

Sim, jantou várias vezes com o ex-diretor Renato Duque, homem do PT na Petrobras, preso em Curitiba. Mas não trataram do rateio de propinas. Falaram de política e assuntos gerais. Foram encontros sociais.

Sim, Pedro Barusco, o ex-gerente que entesourou na Suíça US$ 97 milhões, testemunhou conversas travadas entre Duque e Vaccari nas mesas de restaurantes. Mas o tesoureiro não tinha intimidade com ele.

Sim, Vaccari foi ao escritório do doleiro preso Alberto Youssef, em São Paulo. Mas o anfitrião não estava. E ele foi embora. Conversariam sobre o quê? Fui convidado para um encontro sem agenda, desconversou Vaccari. Mas qual seria o assunto da conversa? Essa dúvida eu também tenho, ele desconversou.

Sim, recebeu dinheiro de empreiteiras enroladas no cartel da Petrobras. Visitou os executivos das empresas. Mas os encontros foram institucionais. E não recebeu senão "doações legais, registradas na Justiça Eleitoral". De resto, PMDB e PSDB também receberam.

Tomando-se Vaccari a sério, os delatores que o entregaram, os agentes federais que o investigaram, os procuradores que o denunciaram e o juiz que o converteu em réu integram um grande complô para fazer de um tesoureiro modelo um corrupto.

Ou tudo se reduz a uma grande conspiração ou o PT descobriu uma maneira legal de ser desonesto. Evoluiu do "dinheiro não contabilizado" do mensalão para a propina legalizada.  Converteu a Justiça Eleitoral numa imensa lavanderia de verbas sujas.

Ao lançar mão de tantas meias verdades, Vaccari acaba reforçando a impressão de que conta apenas a metade mentirosa. A tática pode ser últil à defesa do tesoureiro. Mas transforma o PT numa legenda indefensável.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.