Brasil vira espectador desinformado da Venezuela
O governo brasileiro acompanha a convulsão que se estabeleceu na Venezuela como um mero expectador desinformado. O Planalto não age, apenas reage. No início da manhã, quando o líder oposicionista venezuelano Juan Guaidó anunciou a "fase final" do movimento de deposição do ditador Nicolás Maduro, imaginou-se no alto-comando do governo que o desfecho seria iminente. Mas essa impressão dissipou-se rapidamente. O governo agora faz um número de apostas compatível com o grau do seu desconhecimento sobre os meandros da crise.
Em sintonia com a avaliação de todos os estudiosos do caos venezuelano, o Planalto considera que o desfecho da encrenca depende do comportamento das Forças Armadas. A sensação de que a adesão a Guaidó poderia ser mais densa foi potencializada pelas imagens em que ele se exibia ao lado de militares fardados e de outro líder oposicionista, Leopoldo López, que estava em prisão domiciliar, sob forte vigilância, desde 2014.
A repressão que veio na sequência, com a imagem chocante de um blindado atropelando manifestantes, levou o Planalto a moderar seu entusiasmo. A impressão que vigora no momento é a de que a crise mudou de patamar, pois um pedaço da estrutura militar migrou para o lado de Guaidó. Entretanto, o Planalto concluiu que a migração pode ter relevo apenas quantitativo. Em termos qualitativos, a cúpula militar se mantém leal a Maduro.
Foi essa a principal avaliação feita durante reunião de emergência convocada por Jair Bolsonaro para analisar o recrudescimento da crise venezuelana. Participaram, além do presidente, o vice Hamilton Mourão e três ministros: Fernando Azevedo (Defesa), Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional) e Ernesto Araújo (Relações Exteriores).
Nesse cenário em que a oposição começa a penetrar nos estratos de menor patente das Forças Armadas, as autoridades brasileiras deduzem que se tornou improvável a manutenção do quadro em que Maduro vinha tolerando o convívio com a autoproclamada presidência interina de Guaidó. A partir desse novo ambiente, as avaliações se desdobram em três cenários —sempre condicionados à evolução dos humores dos militares.
Num cenário que o próprio Planalto considera excessivamente otimista, o apoio popular a Guaidó se intensificaria, vitaminando o líder oposicionista para negociar com a cúpula militar uma transição pacífica que incluísse anistia e, eventualmente, salvo-conduto para que oficiais e o próprio Maduro deixassem a Venezuela com seus familiares.
Num cenário pessimista, Maduro assegura os privilégios que conservam as altas patentes militares do seu lado e sufoca o princípio de sublevação pró-Guiadó. Na sequência, providencia para que a guarda nacional e as milícias bolivarianas empurrem as ruas de volta para casa. Por último, prende Guaidó, comprando briga com a comunidade internacional.
Num cenário ultrapessimista, a crise escapa definitivamente ao controle e descamba para uma guerra civil. Em qualquer hipótese, o que chama a atenção é a aparente incapacidade do governo brasileiro de influir na conjuntura.
Durante mais de uma década, sob Lula e Dilma Rousseff, o governo brasileiro bateu palmas para as maluquices dos autocratas de Caracas —Hugo Chávez e Nicolás Maduro. Nessa época, vigorava em Brasília a diplomacia das empreiteiras, levadas à Venezuela com o dinheiro barato do BNDES.
Sobraram os escândalos, o calote no banco companheiro e a ruína que despeja venezuelanos como detritos no quintal dos países vizinhos. Hoje, o governo conservador de Bolsonaro limita-se a torcer passivamente por Guaidó. De positivo, por ora, apenas a reiteração de que o Planalto afasta qualquer hipótese de uma ação militar do Brasil na Venezuela.
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