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Cardozo rebate as críticas do juiz da Lava Jato

Josias de Souza

19/02/2015 02h45

O ministro José Eduardo Cardozo rebateu na noite desta quarta-feira (18) críticas feitas horas antes pelo juiz federal Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba. Em nota veiculada no site da pasta que comanda, Cardozo anotou que "em nenhum momento recebeu qualquer solicitação de advogados de investigados na operação Lava Jato para que atuasse no sentido de criar qualquer obstáculo ao curso das investigações em questão ou para atuar em seu favor em relação a medidas judiciais decididas pelos órgãos jurisdicionais competentes."

Responsável pelos inquéritos que desvendam a corrupção na Petrobras, Sérgio Moro utilizara um despacho no qual renovou a ordem de prisão preventiva contra quatro executivos de empreiteiras para tachar de "intolerável" as reuniões que advogados dos detentos mantiveram com Cardozo para "obter interferência política". Evocando o noticiário sobre as conversas com o ministro, o juiz escreveu que as questões processuais devem ser discutidas pelos advogados "nos autos". Realçou, de resto, que recebe defensores dos investigados "quase cotidianamente".

Em sua nota, Cardozo declarou que teria reagido à altura se lhe tivessem feito algum pedido impróprio. "Caso tivesse recebido qualquer solicitação a respeito, em face da sua imoralidade e manifesta ilegalidade, teria tomado de pronto as medidas apropriadas para punição de tais condutas indevidas".

Sérgio Moro havia se referido às reuniões como uma "indevida, embora mal sucedida, tentativa dos acusados e das empreiteiras de obter uma interferência política". Cuidadoso, o juiz poupara o ministro. "Sequer é crível que se dispusesse a interferir indevidamente no processo judicial e na regular e imparcial aplicação da Justiça", anotara em seu despacho.

Na opinião de Cardozo, reiterada na nota, "é dever do Ministro da Justiça e de quaisquer servidores públicos receber advogados no regular exercício da profissão conforme determina o Estatuto da Advocacia." Essa posição rendeu-lhe no final de semana um ataque frontal do ex-presidente do STF Joaquim Barbosa. "Você defende alguém num processo judicial. Ao invés de usar argumentos/métodos jurídicos perante o juiz, você vai recorrer à política?", alfinetara o ex-relator do mensalão nas redes sociais.

Barbosa pedira o escalpo de Cardozo: "Nós, brasileiros honestos, temos o direito e o dever de exigir que a Presidente Dilma demita imediatamente o ministro da Justiça."

O noticiário do final de semana fez menção a três encontros do ministro com advogados de presos da Lava Jato. Cardozo repetiu na nota que "a única audiência concedida" foi aos defensores da construtora Norberto Odebrecht. Deu-se, segundo ele, "no dia 5 de fevereiro, às 15h30, conforme registrado em agenda pública e em ata." Porém, o ministro admitira em entrevista à repórter Catia Seabra que sua agenda, que deveria ser pública, nem sempre é divulgada.

"Todos os compromissos oficiais são marcados regularmente", dissera Cardozo, antes de admitir: "Muitas vezes, por força da dinâmica do ministério, atividades são alteradas. Percebemos agora que, por falha do sistema de registro, o agendamento alterado não foi recolocado no sistema. Há vários dias em branco. Alguns se referem a férias. Outros a essa falha." De resto, a assessoria do ministro reconhece que ele esteve também com o advogado Sergio Renault, que defende o preso Ricardo Pessoa, dono da UTC.

Alega-se, porém, que o encontro com Renault foi fortuito e limitou-se a uma troca de cumprimentos na ante-sala do gabinete do ministro. Nessa versão, Cardozo recebera em audiência o advogado e ex-deputado petista Sigmaringa Seixas. Como Renault havia agendado um almoço com Sigmaringa, combinou de encontrá-lo no Ministério da Justiça. E o ministro o teria brindado com um aperto de mãos e um dedo de prosa banal.

Por uma dessas coincidências fatais, Ricardo Pessoa, o cliente do doutor Renault, deu meia-volta no acordo de delação premiada que negociava com o Ministério Público Federal no Paraná. Acusado de ser o coordenador do cartel que trocou propinas por negócios na Petrobras, ele teria muito a delatar.

Cardozo se nega informar de forma transparente o que diabos foram fazer na sala dele os participantes da "única audiência" que diz ter concedido a advogados de encrencados na Lava Jato. Escreveu em sua nota que "a empresa Odebrecht, na oportunidade, noticiou a ocorrência de duas eventuais irregularidades que exigiriam providências do Ministério da Justiça, não guardando nenhuma pertinência com quaisquer decisões judiciais tomadas no caso."

O ministro acrescentou que "essas irregularidades ensejaram a apresentação formal pela empresa de duas representações que se encontram em tramitação no Ministério da Justiça." Qual o teor dessas petições?, indagara na véspera a repórter Catia Seabra.

E Cardozo: "Não posso responder. Tenho que zelar pelo sigilo legal. Sei que o fato de estar impedido de divulgar todas as representações faz com que pessoas maldosas especulem sobre o conteúdo dessa reunião. Não teria sentido que o conteúdo não fosse estritamente o que estou dizendo, até pelas cautelas formais que foram tomadas." Então, tá!

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Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.


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