Dilma ao PMDB: ‘somos imperfeitos,mas transformadores’; os outros, recessão
No seu estado natural, Dilma Rousseff costuma tratar o PMDB com a hispidez de um cacto. Mas o partido do vice-presidente Michel Temer foi apresentado a uma outra Dilma na noite passada. Doce e sedutora, ela deixava a Vênus de Milo no chinelo. Com a vantagem de ter braços e poder estender sua mão de seda até para desafetos como o deputado Eduardo Cunha.
A duas semanas da convenção em que o PMDB decidirá sobre a renovação de sua aliança nacional com o PT, a candidata à reeleição jantou com a federação de caciques da legenda. Ouviu juras de apoio. E retribuiu com uma profusão de afagos, democraticamente distribuídos num discurso de meia hora. Soou ácida apenas nos trechos em que desqualificou os antagonistas Aécio Neves e Eduardo Campos. Espargiu veneno também ao falar de sua crença na derrota do tucanato na briga pelo governo de São Paulo.
Cercada de PMDB por todos os lados, Dilma enalteceu a parceria que atou seu governo à legenda de modo peculiar: foi "com essas forças políticas que nós construímos essa aliança, eivada de imperfeições, como somos todos nós", disse ela. "Não há como um produto humano não ser imperfeito. Mas, na sua imperfeição, a aliança dá conta da realidade."
Dilma comparou o seu condomínio aos arranjos partidários de seus rivais: "Não creio que há nenhuma outra aliança nesse país, hoje, que apresente o potencial de transformação que nós apresentamos. É esse o fato fundamental: o que nós temos de potencial de transformação. É o que nós temos que aponta o futuro desse país." Disse isso no epílogo de um discurso no qual recobriu de elogios personagens como José Sarney, Renan Calheiros, Jader Barbalho, Edison Lobão e um enorme etcétera.
A certa altura, Dilma entregou-se a "uma reflexão sobre as demais alianças". Falou de Aécio Neves sem mencionar-lhe o nome: "Nós sabemos que uma das alianças significa recessão, desemprego e arrocho salarial. Isso são as chamadas 'medidas impopulares', só para início de conversa."
Enumerou as providências que acredita que Aécio adotaria se virasse presidente: "Fim da política industrial, porque acaba-se, por exemplo, com o PSI [Programa de Sustentação do Investimento, do BNDES]. É vergonhoso para essa aliança subsidiar investimentos, é vergonhoso para essa aliança o programa Minha Casa, Minha Vida, é vergonhoso para essa aliança todos os processos que implicam em ganhos reais de salário."
Dilma desancou também Eduardo Campos e sua parceira de chapa, Marina Silva. De novo, absteve-se de chamá-los pelo nome: "A outra aliança, que pode, aparentemente, se apresentar como avançada, é a aliança daqueles que são contra hidrelétricas". A presidente parecia evocar os embates que travou, como chefe da Casa Civil de Lula, com Marina, então ministra do Meio Ambiente.
Nas palavras de Dilma, a dupla Campos-Marina empina "a proposta dos que pretensamente são avançados e nos acusam de atraso. Mas são eles que defendem uma meta de inflação de 3%. Além dessa meta de inflação de 3% —que leva à recessão, desemprego e arrocho, porque não tem milagre— são aqueles, também, como muito bem me lembrou o Temer, dão uma no ferro e outra na ferradura."
Mirando novamente em Marina, Dilma prosseguiu: eles "são contra o agronegócio porque o agronegócio polui, porque o agronegócio produz veneno para as pessoas se alimentarem. E, ao mesmo tempo, são a favor do agronegócio." Voltando-se para Sérgio Cabral, ex-governador do Rio, a presidente arrematou: "Então, nós vivemos, hoje, Sérgio, tempos muito estranhos. E, nesses tempos estranhos, nós podemos ter certeza de que temos o maior potencial transformador."
Noutros tempos, Dilma costumava meter medo no PMDB. Nesses tempos reeleitorais, arrancou da plateia quatro salvas de palmas. A mais forte foi ouvida nas pegadas da frase final: "Eu contei com essa aliança para chegar até aqui. Agora, eu conto não é para me eleger, eu conto para nós governarmos daqui para a frente."
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