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Josias de Souza

Brasil esteve a um travessão da morte nacional

Josias de Souza

28/06/2014 22h50

Copa do Mundo no Brasil. Que esperar da seleção brasileira? No mínimo, o máximo. E o que se vê até aqui? Bem, o time vem jogando algo muito parecido com o futebol. Só que mais feio. E o país fica se perguntando: quando, afinal, aquela equipe que brilhou na Copa das Confederações vai entrar em campo?

A coisa anda estranha desde o começo. O triunfo magro sobre a Croácia. O placar virgem contra o México. O básico convertido em apoteose contra Camarões… Todos esses avisos reclamavam uma reação no primeiro jogo da fase em que só há duas alternativas: matar ou morrer.

Pois bem. Em vez de uma resposta, sobreveio o inaceitável. No primeiro tempo, um erro banal presenteou o Chile com o empate. No segundo, registrou-se no lado do campo reservado ao Brasil um apagão. As arquibancadas do Mineirão testemunharam cenas deploráveis. Os rivais chilenos, apenas razoáveis, ditaram o ritmo aos donos da casa. A apatia flertava com o suicídio.

Eis a verdade: existe uma caveira de burro enterrada no meio-campo do Brasil. Fernandinho, que seria a correção de Paulinho, teve desempenho fraquinho. Entrou Ramíres. E nada. De duas, uma: ou é maldição ou aquela sequência de chutões erráticos é o resultado da falta de jogador.

Em respeito aos fatos, é preciso reconhecer que havia 23 jogadores em campo. Seria uma injustiça não incluir o árbitro. Ele foi o principal marcador de Hulk. Deixou de marcar um pênalti cometido contra ele. E, não satisfeito, desmarcou-lhe um gol. Mas um selecionado que se preza não pode depender só da honestidade dos árbitros.

No intervalo que antecedeu a prorrogação, alguns jogadores, mãos postas, apelaram para Deus. Como se o Altíssimo se interessasse por futebol. Melhor excluí-lo do time. Poucas vezes houve uma seleção tão sem Deus quanto essa do Brasil. Prova-o o desperdício de dois pênaltis numa série de cinco.

Para quem esperava cultuar Neymar, deve ser exasperante perceber que o goleiro virou heroi da resistência. Diz-se que Júlio Cesar, autor de duas defesas redentoras, foi o grande nome do jogo. Erro. Houve outro personagem bem mais decisivo: o travessão! Foi o travessão quem impediu, a dois minutos do apito final, que um gol do chileno Pinilla decretasse a morte nacional. Não fosse pelo travessão, o Brasil teria saído do Mineirão de rabecão.

Vem aí a Colômbia. Seria um adversário banal. Mas virou um gigante insuspeitado. Depois deste sábado, alguns patrícios cultivarão um terror reverencial pelos colombianos. Até o dia do jogo, os brasileiros se encontrarão e, antes do 'bom dia', antes do 'tudo bem?', virá a pergunta: viste o James Rodriguez? Shhhhh…, fala baixo. Não assusta as crianças!

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.